O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, anunciou nesta
semana que, em outubro, a pasta fará uma reunião para definir mudanças e
incentivos para o ensino médio. A reunião tratará da reformulação
curricular, proposta pelo MEC na segunda quinzena de agosto. A ideia é
que o currículo seja organizado nas quatro áreas do conhecimento
exigidas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) - matemática e suas
tecnologias; linguagens, códigos e suas tecnologias; ciências da
natureza e suas tecnologias e ciências humanas e suas tecnologias.
Atualmente, o ensino médio da rede pública tem 13 disciplinas
obrigatórias, mas pode chegar a 19 com as opcionais.
Frente aos maus resultados do ensino médio no Índice de
Desenvolvimento do Ensino Básico (Ideb), Mercadante defende que um
currículo mais flexível e menos fragmentado pode melhorar o desempenho
nessa área. Segundo o ministro, focar o ensino no Enem seria uma forma
de atender às expectativas dos alunos, que, com a valorização do exame
na entrada na universidade, vão cobrar principalmente uma coisa das
escolas: passar no vestibular.
O professor Ocimar Munhoz Alavarse, da Faculdade de Educação da
Universidade de São Paulo (USP), no entanto, considera a proposta
"estranha". "Essa posição diante dos resultados (do Ideb), sem um estudo
aprofundado, é complicada. É preciso investigar, mas, pessoalmente,
estou convencido de que número de disciplinas não é o maior problema -
embora haja, de fato, muitas disciplinas", avalia. O educador também
critica a proposta de utilizar o Enem como modelo para o ensino médio,
inclusive para sua avaliação. "É dar um poder muito grande ao Enem. Nós
podemos repensar o currículo, mas sem misturar as coisas. O Enem não tem
tanto poder, nem deve ter", argumenta.
Para o professor, outras questões influenciam no baixo desempenho,
como a falta de infraestrutura das escolas. No entanto, para ele, a
questão principal é a formação e a contratação dos professores. Ele
destaca que o ensino médio sempre teve dificuldades no recrutamento de
profissionais qualificados. "Além disso, como nossos professores são
formados? Por disciplinas", diz Alavarse, expondo uma das principais
preocupações diante à reformulação: a adaptação dos docentes ao novo
currículo.
O professor Chico Soares, que integra o grupo de avaliação e medidas
educacionais da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas
Gerais, acredita que o processo é inverso. "Todos falam na formação do
professor como se fosse um problema, mas antes de decidirmos como ele
será formado, temos que saber o que ele irá ensinar. O ensino médio não
tem solução antes que se mude o projeto dele", defende, ressaltando que o
plano ainda está sendo discutido e que não há nada pronto para ser
implementado.
Para Soares, houve um "ruído" na compreensão da nova proposta de ensino. Primeiramente, ele destaca que não se sugere uma "fusão" das 13 disciplinas em quatro áreas, mas sim dar foco e profundidade ao conhecimento. "A proposta é focar as competências. Nosso currículo tem 1 km de extensão e 5 cm de profundidade", declara. O educador acredita que as aulas devam ser direcionadas para aspectos práticos da vida do aluno.
Klinger Marcos Barbosa Alves, 2º vice-presidente do Conselho Nacional
de Secretários de Educação (Consed), concorda com Soares ao dizer que
ainda há mais perguntas do que respostas na mudança do ensino médio e
que a proposta ainda está em construção. "Precisamos saber como isso
será feito, como juntaremos as áreas sem prejudicar conteúdos", afirma.
Para ele, assim como para Alavarse, um dos pontos mais polêmicos da
proposta é a formação dos professores.
"É um novo perfil de formação do professor. Hoje, há licenciaturas
específicas, são linhas que têm currículos e diretrizes nacionais. Esse
docente deverá ter preparação para pensar o trabalho de forma diferente,
e isso tem impacto nos currículos. Também precisamos pensar nos
professores que já estão formados", diz.
O secretário aponta, contudo, outras questões que devem ser
discutidas para a melhoria do ensino, como a evasão escolar. "O aluno já
entra no ensino médio com dificuldade, com uma formação ruim, algo que
já vem do ensino fundamental. Precisamos descobrir como trazer e manter o
estudante na escola", afirma. Alves acrescenta à lista de dificuldades a
pressão que o aluno sofre da família, que exige que ele trabalhe, o que
tira tempo dos estudos.
"Talvez acoplamento em quatro áreas seja necessário, mas não seja a
única medida que deva ser tomada", conclui o secretário, destacando a
dificuldade, sob ponto de vista pedagógico, de manejar tantos
professores no currículo atual.
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