segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Propostas arrojadas para uma economia solidária

Obra reúne experiências da economia solidária e propõe alternativas às desigualdades produzidas pelo capitalismo

Dádiva, Identidade, Justiça cognitiva, Património comum da humanidade, Redes sociais e Utopia são alguns dos verbetes que compõem o Dicionário Internacional da Outra Economia. A "outra economia" - explica o professor Pedro Hespanha, sociólogo e um dos coordenadores da publicação - "é uma resposta às insuficiências da economia capitalista que nos rege propostas para um novo modo de produzir que atenda às necessidades humanas e que seja compatível com o ambiente".

A obra, elaborada já segundo o novo Acordo Ortográfico, resulta do cruzamento de experiências concretas da chamada "economia solidária" e da investigação académica sobre tais temas. "A ideia central é de que outros valores, como solidariedade e generosidade, podem nortear a economia. A lógica capitalista de 'viver para produzir' precisa de ser invertida para incluir os marginalizados. Os verbetes resultam do acúmulo de experiências concretas em todo o mundo e de conceitos teóricos que atravessam a história de cada verbete", argumenta o professor Antonio David Cattani, também coordenador e professor do departamento de sociologia no Rio Grande do Sul, Brasil.

Publicado em 2009 em Portugal, a génese do dicionário está nos seminários e debates promovidos no âmbito do Fórum Social Mundial de 2002, realizado no Brasil. Em 2003, foi publicada a primeira versão do dicionário, que ganhou traduções e adequações em França, Itália e Espanha. Entre os 52 autores que elaboraram os 57 verbetes estão politólogos, sociólogos, filósofos, juristas, psicólogos, gestores e, claro, economistas. "É uma obra multidisciplinar, reúne os conceitos fundamentais sobre solidariedade das diversas áreas das ciências sociais. Alternativas à produção económica é um debate muito sério, que em plena crise deve ser debatido pelo conjunto das disciplinas", defende Pedro Hespanha.

Na abertura da obra, o sociólogo Boaventura de Sousa Santos nota que em Portugal a "persistência de formas tradicionais de cooperação e solidariedade torna-se visível em muitos sectores da pequena produção, em grupos sociais que foram marginalizados e em territórios do País que foram deixados para trás". Economia da Família, Economia Feminista, Microempreendedorismo e Terceiro Sector são alguns dos verbetes desenvolvidos por investigadores portugueses e que possuem particular identidade com a realidade nacional. "Há conceitos que fazem mais sentido num cenário luso-brasileiro e africano. Os verbetes estão relacionados com iniciativas económicas, como o microempreendedorismo, que não se enquadram na economia tradicional. As entradas explicam a origem dos termos, historiciam o seu percurso, abordam experiências e defendem uma perspectiva diversa", sublinha a socióloga e autora Sílvia Ferreira.

Organizações não governamentais, associações, cooperativas, entidades sindicais e mesmo instituições públicas estão entre o público privilegiado da obra, que se propõem como um ponto de partida para a discussão de alternativas não apenas para o de-senvolvimento económico, mas para modos de produção "mais justos e solidários", enfatiza António David Cattani. "No Brasil, as propostas do livro têm sido discutidas por instituições públicas como alternativas para a criação de trabalho e geração de renda. É preciso sensibilizar os diversos actores para o facto de que nada é definitivo ou categórico, a crise económica mundial exige alternativas e elas existem, a dificuldade é encontrarem espaço de discussão entre o pensamento dominante."

A Dádiva, verbete desenvolvido pelo sociólogo francês Alain Caillé, "pode ser definida como o oferecimento aos outros de um bem ou serviço sem garantia de que haverá retribuição, mas com esperança de que ocorrerá correspondência, situação que pode estabelecer relações de aliança e de amizade. Utopia, escrito por Cattani e que encerra o dicionário numa tentativa de abrir portas, "significa desejo de alteridade, convite à transformação que constrói o novo, a busca da emancipação social, a conquista da liberdade".

por ISADORA ATAÍDE 19 Fevereiro 2010
no sítio: http://dn.sapo.pt/inicio/economia/interior.aspx?content_id=1498374

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